sexta-feira, setembro 05, 2008

Vista de Satélite da Musalla do Torrão: Um Monumento de tamanho descomunal e"impar" no Al-Andalus.

Uma Proposta de Reconstituição com base em fotografia de satélite.
Comprimento total do muro da Qibla, 61 m (incluindo os 3,4 m da Torre do Mihrab).
A referida Torre-Mihrab encontra-se sensivelmente a meio do muro da Qibla.

9 comentários:

Anónimo disse...

Mas que fotografia tão nítida, os meus parabéns. Qual é a fonte?
Infelizamente não conheço muito o Torrão. Mas ao olhar para essa foto há ali algo que desperta a atenção. Um edíficio contíguo á proposta que aqui fez. Pela Foto pareçe tratar-se de um Convento. Pela tiplogia é isso que faz lembrar, sendo possível identificar o claustro. Na outra extremidade da foto, há ali uma fonte ou lago que salta á vista.

ARC disse...

A Fonte é o Serviço de Informação Geográfica do Município de Alcácer, que utiliza a base nacional de Informação Geográfica Nacional.
É a mesma base que usa o Google, só que no acesso livre a nível mundial a escala vai até aos 800/500 m de altitude. Conforme o tema em analise, utilizo uma escala ou outra de acesso livre. Em relação à estrutura anexa à Musalla Islâmica, trata-se do Convento da Clarissas do Torrão, fundado nos finais do século XVI e neste momento espaço de habitação particular. Nessa altura a musalla (que se resumia provávelmente a uma cerca) pertencia a outro particular e entre os dois conjuntos arquitectónicos, havia uma rua publica (a antiga estrada medieval para Beja). Em finais do século XVII ou inícios do XVIII o dono da musalla (de nome desconhecido)oferece o imóvel às freiras, que anexam o espaço, desactivando a rua, que desde então ficou incorporado no que vai ser a nova cerca do convento, numa situação que se mantem até hoje. Brevemento no site do municipio ficará disponível um estudo sobre este enigmático conjunto arquitectónico "sem paralelo penínsular".

ARC disse...

Para concluir, o Torrão está a revelar um conjunto interessante de vestígios (já conhecidos), que tenho estao a analizar e que permitem renovar a História (surpreendente) desta Vila, não só em contexto medieval, mas tambem para a Fase Romana.

Anónimo disse...

Este blog é muito interessante.

É verdade que (à semelhança de Alcácer, Évora e Mértola)grande parte das igrejas a sul do Mondego já foram mesquitas?

A musalla de Arrifana é califal. Neste caso, diz respeito ao Califado de Córdova?

Se Alcácer foi, durante o período almóada, uma cidade muito poderosa, porque é que a seguir a Navas de Tolosa foi, do lado português, logo a primeira a cair e precisou de chamar um exército em seu auxílio?

Agradecia resposta.
Continuem com o blog.

ARC disse...

Nem todas as actuais igrejas a sul do Mondego foram mesquitas. Temos que analisar um caso de cada vez. Se menciona Alcácer, Évora ou Mértola a resposta é sim. Em relação à musalla da Arrifana, ela não é Califal, mas sim de cronologia Almorávida, na sua fase final.
Quando refere uma Musalla Califal, penso que estará a pensar da Musalla Emiral da Rabita de Guardamar do Segura, localizada em Espanha. Quando nós dizemos que determinado edifício é Califal, Emiral, Aftássida, etc, estamos quase sempre a utilizar estes termos, como orientadores cronológicos do texto que estamos a elaborar. A sociedade humana vive segundo regras e a Estrutura Politica vigente em cada época altera por vezes as "regras". Contudo temos que saber como devemos utilizar esses termos.
Por exemplo, tem sentido falar de uma Fase Wazir em Alcácer, inserido no Califado Almoada pós 1191, porque apesar da super-estrutura politica ser o Imperio Magrebino dos Almoadas/Unitários, na realidade o Banu Wazir que governavam Alcácer estavam quase por "conta própria". Em relação a Alcácer, após Navas de Tolosa, a questão é facil de responder. Uma coisa é o Império Almoada, outra é o sentimento de pertença das pessoas que são governadas. É claro que os Alcacerenses por oposição aos Portugueses consideravam-se muçulmanos, depois Andaluses. Ser Almoada era uma questão de prestígio, ligado ao exercicio do poder politico e religiosos e teria que ser provado por meio de provas geneologicas. Os andaluses eram quase sempre tratados como "cidadãos de segunda". Quando o aparelho estatal Almoada sofre uma crise militar, após Nava de Tolosa, o Andalus fica literalmente "orfão". Ou seja, nada espera da ajuda de um estado imperial muçulmano que sempre foi sentido como um corpo estranho. O estado falha e a iniciativa de defesa das cidades islâmicas passa para a "iniciativa privada". É que irá acontecer em Alcácer, por isso é coerente falar de uma Fase Waziri após Navas de Tolosa.
A razão porque do lado português Alcácer foi a primeira cidade a cair, tem a ver com a pressão militar que os Alcacerenses faziam sobre a costa portuguesa. Pelo menos foi esse um dos argumentos utilizados pelo Bispo de Lisboa para aliciar os cruzados (para além do saque e posse de escravos) a juntarem-se com as tropas portuguesas para o ataque a Alcácer. D. Afonso II está ao corrente do projecto, mas talvez pesimista em relação ao desfeixo final, prefere tratar do aparelho burocrático do seu Reino e vai para Santarem. Quando sabe da vitória, é um dos primeiros a comunicar ao Papa, ciente que uma resposta do Papa a felicitar o feito tinha um papel incontornável para justificar o direito que tinha para o exercício do poder politico como rei.
Para aprofundar estas questões, poderá consultar os trabalhos em PDF que regularmente são inseridos no site do Município de Alcácer.

Anónimo disse...

Grande blog.

Gostaria de saber quem eram na realidade os moçárabes, e qual o papel deles em Alcácer do Sal nos últimos anos do período islãmico.

Anónimo disse...

E em relação ao período entre 1217 e 1607 (ano da ordem de expulsão das comunidades mouriscas ibéricas efectuada por Filipe II)? Não há elementos em relação à história destas comunidades em Alcácer?

ARC disse...

Em relação à primeira questão - Os moçárabes. Correspondem à componente populacional de crença cristã, de rito visigótico que ficou em território islâmico, pagando os seus impostos. Em relação a Alcácer, não tenho neste momento dados seguros para responder. O que sabemos é que em contexto Almoada, entre 1191, existiam cristão em Alcácer na condição de prisioneiros de guerra e escravos. Nesta área de fronteira com Portugal, desde a praia da Comporta e até Badajoz, foi determinado entre os beligerantes que Alcácer, Beja e moura seriam as praças fortes que tinham cativos à espera de serem resgatados por emissários cristãos designados para o efeito. Pouco depois essa tarefa foi assumida por uma Ordem religiosa, autorizada pelo Papa, dando origem à Ordem dos Trinitários. (o nome Trinitários, alusivos à Santissima Trindade, foi escolhida para ofender os Unitários (da natureza de Deus) do lado islâmico, ou seja os Almoadas).

ARC disse...

Em relação à segunda questão: - A presença da comunidade islâmica em Alcácer, após a conquista de 1217.
Descontando os exageros da época, importa relembrar o impacto que causou a chegada de 3 000 alcacerenses de credo islâmico, vendidos em Lisboa como escravos após a conquista. Pessoalmente penso que a quase totalidade da população moura cativa foi levada para Lisboa, porque o rei D. Afonso II estava em Santarem e Coimbra a tentar de "papelada burocrática". Quando pouco depois teve conhecimento da conquista, é sintomático 3 actitudes que tiveram força de Lei: - Concessão de novo Foral ao termo de Alcácer em 1218, Manteve o Foral dos Mouros Forros (atestando deste modo a existência de uma comunidade em Alcácer que terá ficado, juntando-se provávelmente muitos que tinham sido levados a Lisboa para serem vendidos!). Por fim, rectifica de novo Alcácer para sede da Ordem do Ramo Português da Ordem de Santiago, com direito aos seus "mouros".
Resumindo: - Apesar da proibição canónica islâmica de permitir muçulmanos a viverem "livremente" em território cristão, alguns alcacerenses por cá ficaram. A comunidade Moura dividia-se em três partes: - 1. Os mouros que pertenciam ao rei e que lhe pagavam imposto.2. Os que pertenciam à Ordem de Santiago e que lhe serviam e pagavam imposto. 3. Os escravos mouros, que pertenciam à igreja, à câmara ou a particulares.
No século XIII a XIV, basicamente a comunidade foi deminuindo em expressão demográfica e poderio económico. No século XV teria pouca expressão. Após a conquista de Ceuta, começaram a chegar a alcácer mouros escravos de origem magrebina, culturalmente diferentes da comunidade que por cá tinha ficado após a conquista.
Após a implementação da Inquisição já no tempo de D. João III, admito que terá havido à semelhança do que aconteceu com a comunidade judaica, mouros que assumiam-se como cristãos, mas que em segredo seguiam a sua fé, num fenómeno que chamo de Cripto-Islamismo. Uma prova da sua existência é de existir documentação régia do tempo dos Filipes a pedir que o povo denuncie às autoridades competentes, a presença de "mouros disfarçados", para serem expulsos para Marrocos. Como é natural, pouca documentação sobreviveu...